sexta-feira, 11 de janeiro de 2013

Estrela Cadente

Preciso de sua permissão para dizer adeus...

Novas portas virão. Para nós! 
E de longe nos saudaremos através de janelas.
Talvez sintamos desejos de nós mas que não passarão de flores saudosistas. 
Os vidros irão embaçar com os nossos soluços: sem rostos... Nossa despedida.

E assim partiremos, querida.
Talvez você não venha a acreditar, mas eu te amo. Hoje, e quem sabe, depois que reabrir os olhos.
Talvez tenhamos sido nós em outro ontem, mas hoje, não dá. 

Hoje não...

Preciso da tua boca para te dizer adeus.
Preciso do teu hálito para poder dizer que valeu a pena. Que valeu o amor

Que o amor fica, e com ele faremos boa viagem.
Que o desejo um dia vai-se embora.
Mas que fomos, um do outro,

 Estrelas cadentes.


Como diria Olavo Bilac:
 "Amai para entendê-las! 
Pois só quem ama pode ter ouvido 
Capaz de ouvir e entender estrelas"

segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

Acontece é que a vida andava bem mais ou menos.

No começo era até muito bom, mas agora o "nem muito e nem muito pouco" incomodava. E talvez esse incômodo advinha do último fôlego dado antes de ter cedido à suas próprias promessas.




Ela o esperava do outro extremo da rua. Rua estreita, escura. O excesso de árvores enfileiradas nas duas calçadas permitia escutarem tudo: do silêncio aos roncos de duas almas.
Sabiam que deixar a alma dormitar era arriscado demais, mas naquele momento não havia outra alternativa a não ser esperar.
Entreolhavam e entristeciam-se.
Pareciam duas estátuas dispostas frente a frente. Mas alí, dentro daquela redoma situacional,havia lembranças demasiadamente lapidadas- a ponto de terem perdido a condição humana.


(continua...)

segunda-feira, 5 de novembro de 2012

Tenho espasmos de qualquer coisa.
Vontades súbitas de para-quedas, mas o que faço é por menos açúcar no café.
E eu levanto a cabeça - o nariz enxuto fica com o cheiro dos pedaços de canela colocados minutos antes de dormir debaixo do travesseiro.
Minhas coragens quaisquer não são e soam como coragens verdadeiras e as variações sempre ficam pra depois.
E eu me pergunto: pra quê tanta vírgula? E a resposta vem sempre contraditória. "E o que tem de mau?"
Me pergunto como seria não ser eu.
E se não me fosse, sentiria o peso de ser outro?
Sentiria o peso d'alma de outrem?
Teria eu-outro o cheiro de canela desenhado no cabelo?

E eu levanto o cabeça.

Deixo, sem sucesso, o pensar sentado na mesa da cozinha, na xícara de café que lavei, no rosto mal lavado e corro pro mundo para viver uma ou três doses de para-quedas fajutos.

E o que tem de mal?

quinta-feira, 4 de outubro de 2012

Fotografia


P
assou a noite em claro, e foi, com a Dona do Céu, que dividiu suas preocupações.

Atordoado com a situação, engolia as pílulas juntamente com os passos do ponteiro e esperanças quase mortas, como ele.

O futuro escorreu-esvaiu areia e se perdeu com a tempestade.A dor vinha mesmo do presente. Sentia-se apodrecendo- Era a alma, sim, a alma! Apodrecia sem qualquer redenção.Diferente do infeliz, as pílulas alcançavam o triunfo.

Sentia-se fera sedada e o animal, agora indefeso, admitia derrota e caminhava tremulamente ao leito improvisado.E foi ali, no velho tapete do corredor que os membros cederam e o corpo foi derramado ao chão.
O peso dos pecados era quase imperceptível  e concebeu o som oco, abafado...Som esse que não tornou possível o socorro.
O animal suava frio. E as batidas do coração quase morto-descompassavam.

A cabeça girava ao redor de todos os porta-retratos vazios que ocupavam a parede. Havia na realidade apenas uma foto preenchendo o cenário fúnebre.
Estava com seu pai. Ao fundo havia rosas vermelhas, milhares delas.
Apesar de todo o calor brotado de cada pétala carnuda, os sorrisos eram frios, como numa tentativa erroneamente calculada de compor o cenário. E era disso que viviam: mascarar buracos. Esses buracos d'alma.

O sorriso sisudo do pai, pai esse que já havia morrido para o animal desde sua infância, talhou-se como lembrança ardilosa.
Aquele sorriso havia penetrado. Sim! Penetrado o íntimo da carne; havia destroçado os olhos de pureza infantil.

Desde então, da lembrança negra, a fera se alimentava de rastros. Num delírio convulsivo, tentava jogar os pedaços do corpo para alcançar a fotografia.
'Acalme-se. Estou aqui com você...'
-Coloquei a fotografia próxima a seu quadril. Acredito que ele recolhera toda devassidão daquele dia para dentro de si e uivou pela última vez.
Logo entendi seu recado...
Um pedido que apenas lágrimas de infância roubada poderiam fazer...
Quebrei o vidro do porta-retrato e, gentilmente, deixei um pedaço suficiente em suas mãos.

A fraqueza vinda do cansaço de vida morta e das dezenas de pílulas deixaram apenas um leve risco sobre a garganta.
Minha mão estava agora sobre sua pata, e, juntos, desenhamos o corte: era o sorriso do pai na garganta.

Do sorriso brotava sangue e sua cor lembrava as rosas da fotografia... 

domingo, 23 de setembro de 2012

Pequenos e grandes pecados



Tenho que admitir: sou pecadora

Não me refiro aos pecados cravados em bíblias ou corpos encolhidos devido as cicatrizes de cilícios. Me refiro ao pecado em cerne, aquele que só após permanecer em silêncios longos somos capazes de perceber que existem e criaram raízes, ali mesmo, dentro de nós.


Eu vi a raiz timidamente roçar meu calcanhar e sorri pra ela. Achei que com o tempo ela entenderia que eu não poderia acompanhar e cuidar de seu crescimento. Achei que ela seguiria por si só e eu poderia somente observar por um ou dois instantes quaisquer.
Eu gosto desse meu jeito. O pecado de certa forma torna-me ainda mais humano e o fato de cometê-lo faz-me sentir violentamente viva.
E essa vivacidade toda me deixou um pouco cansada, de modo que tive que deixar todos os  orgulhos e monstros aquietados de lado e deitar na cama para chorar. E com o choro admiti para mim que tinha medo.
Medo desta violência toda de sensações, destas acomodações. Medo de saber sim que poderia ser alguém melhor e simplesmente não colocar o benefício em prática. Tinha medo de alguns monstros que se desenhavam dentro da minha cabeça ( e eu sabia-Sabia sim que todos tinham a minha face).

Me perdoe pelo que te fiz. Tentarei ser alguém melhor.


segunda-feira, 10 de setembro de 2012

Guia de sobrevivência


Eu te disse mais de mil e três vezes: da carne tiro o que bem entender! Esse seu gosto incompreensível em delimitar o destino do sangue, do Meu sangue, já me rendeu bons goles de estafo!
Já a minha lassidão é compreensível! Veja bem, aquele número de telefone deveria ser usado em situações emergenciais! Uma emergência não é um acaso qualquer, uma situação de calçada que qualquer par de conversas pode resolver.
Ora, e agora, o que fazer?! Já disse pra não me envolver em suas folias... Dessa vez eu não me meto! Dessa vez o sangue vai sim pra onde eu bem entender! E você?! Ora, você vai arranjar um jeito de esquecer aquele telefonema- de resto, não sei. Se vira!
Mas que droga! Diz-me porque não consigo fazer surgir três ou oito passos pra longe dessa carniça que você apadrinhou? E toda essa caturrice
 que você transpira e se tornou vai nos adiantar de quê?! Com tanta folia negra não nos restará nem uma morte saudosista...

Você e essa mania de abiscoitar tudo! Isso te levou pro fundo do poço! Agora eu e você somos o seu lodo! Não...Não é possível! Tô me envolvendo nessa momice tua!!! Pela milésima  quarta vez: agora eu me abstenho disso tudo!
O lodo e o triunfo (seja o último o que for) são inteiramente seus. Cá entre nós, que esse melindre natural que Deus e a olência que está entre as coxas da tua mãe lhe deram seja teu guia de sobrevivência.

E o papelzinho que tem o número escrito você me devolva! 
Ai... Que vontade de entorpecer a cabeça toda e sentir que nada disso tá acontecendo...Mas que parvoíce cagada, hein?!
E me diz, o que vai fazer com a ciranda? 
Sim, porque têm fitas rompidas, desaparecidas, sequestradas... Os donos tão por aí procurando, não estão? Eu bem sei que não são tuas! Malandragem, é isso o que faz!
Tua alma tá suja de lodo. Teus olhos já não têm aquele brilho que conheci na nossa infância.
Tua música barulhenta incomoda, não percebe?
Olha, eu te amei sim! Minha lassidão e seu gosto na minha boca não me deixam mentir e dizer (nem a mim) que passou.
Mas a folia e a carniça também são tuas.

O guia de sobrevivência vai dar o seu jeito.



Eu vou embora porque o problema é seu!

quarta-feira, 5 de setembro de 2012

Que voe

A porta do quarto estava quase fechada e quase aberta.
"Tire os meus olhos daqui!" Dizia às palavras quase ilegíveis do papel liberto de um caderno qualquer. A culpa, quieta, foi embora.
 Pra falar a verdade, tinha raiva de sentir aquilo-nem era bonito. Nem era digno, mas não era culpa.
 Era indigno verificar se as madeiras da ponte ainda se encontravam podres. Como se mágica fosse resolver a podridão das coisas...
A culpa foi embora porque era vida que sorria por atenção.
Foi quieta porque sabia que o sentimento era tentador, e o pecado era deixar de ser aquilo que almejava.